O que é ser homem? Essa pergunta deveria ser o questionamento do século XXI. Deveríamos estar em busca dessa resposta. A cura do câncer, a fome no mundo e o conceito “homem” deveriam ser pautas urgentes em todas as esperas sociais. Um questionamento bobo num primeiro momento, mas que traz consequências graves para o mundo em que vivemos. Grande parte das pessoas responderiam essa pergunta de uma forma bem simples, “homem é aquele indivíduo que nasce com um pênis”, correto? Algumas pessoas poderiam responder, “homem é aquele indivíduo que não pode engravidar”, ou ainda “homem é aquele indivíduo que sente atração sexual por mulheres”. Outras ainda diriam que “ser homem é ter características exclusivas como virilidade, liderança, pensamento lógico e coragem”. Muitos podem pensar que tudo isso aí (trocaria por: todas as alternativas) são grandes verdades, correto? Não! Pra alguns homens tudo isso pode ser verdadeiro, mas estamos longe de termos (eu retiraria esse verbo) uma verdade absoluta nesse sentido.
Não é correto usar a nossa genitália como forma de definir se um indivíduo é homem ou mulher. Existem mulheres e homens trans! Se você for um homem cisgênero, isso faz sentido, mas caso contrário não! Esse raciocínio exclui todos os homens transgênero da nossa sociedade. “Mas pra mim o homem precisa ter um pênis”. É mesmo? No ano de 2020 a revista Veja publicou matéria onde afirmava que, no Brasil, 1600 homens cisgênero perdem seus pênis todos os anos. A principal causa é a falta de higiene, mas o fato é, esses (eu trocaria por: mas é certo que) esses homens deixem de ser homens por não terem mais um pênis? É claro que não!
Gravidez e atração sexual pelo sexo oposto também não são bons argumentos para “classificarmos” um indivíduo como homem, afinal, homens transgênero podem engravidar por terem útero e homens gays possuem atração sexual pelo mesmo sexo biológico. Todos esses indivíduos não deixam de ser homens por isso. Não faz com que os homens deixem de ser homens! Além disso, características atribuídas aos homens podem muito bem serem apropriadas para mulheres, como virilidade, liderança, pensamento lógico e coragem. Aliás, muitos homens podem não ser nada disso, ainda sendo emotivos, frágeis e indecisos, e mesmo assim continuarem sendo homens, entendem?
-Todo essa “esteriotipização” do indivíduo “homem” acontece porque estamos imersos num conceito chamado “a caixa do homem”. A caixa do homem nos ensina que para o indivíduo ser homem ele precisa ser hétero, fisicamente apto, corajoso, forte, no controle, ativo sexualmente, com prontidão sexual, não demonstrar emoções, não chorar, ser provedor, competitivo, dominante em relação a mulher, aguentar o tranco, ser bem sucedido e não desistir nunca. Nós fomos (des) educados assim, porém, não faz sentido. Nada disso te coloca no gênero masculino. Nada! Até porque, como diria a escritora Judith Butler, gênero é uma construção social. Gêneros são performances, são comportamentos aprendidos. Nós simplesmente aprendemos que os meninos brincam de carrinho e as meninas de boneca, mas por quê?
Ter essa definição fechada sobre “o que é ser homem” é um enorme problema social. Em 2020, saiu uma pesquisa inédita baseada em dados do Sistema Único de Saúde, mostrando que a cada hora uma pessoa LGBTQIA+ é agredida no Brasil. Segundo a ANTRA – Associação Nacional de Travestis e Transsexuais -, o Brasil é o país que mais mata pessoas travestis ou transsexuais no mundo. Obviamente que esses dados também variam conforme raça e classe social, mas o ponto é, por que tudo isso? Porque as pessoas simplesmente não consideram que essas pessoas sejam homens? A mudança de comportamento dos indivíduos pode começar transformar tais dados, e nós temos um começo.
Que tal começarmos entendendo que homens também choram? Toda criança do sexo biológico masculino já escutou “engole esse choro ou você quer virar uma “mulherzinha”/“viadinho”?!” A maioria das pessoas não param para pensar o quanto essa frase é misógina e homofóbica. Nós vinculamos o choro à fraqueza e comparamos essas pessoas fracas com as mulheres e os gays. Como se o homem que chora pudesse se tornar algum desses indivíduos menores. Além disso, nós acabamos reprimindo suas emoções e sentimentos desde a infância. Engolir e lidar com os sentimentos sozinhos faz com que os homens possuam índices de suicídio 4 vezes maiores do que as mulheres, segundo o ministério da saúde. Colocar os homens em caixinhas está nos matando.
Outro ponto importantíssimo a ser discutido é a questão do homem provedor, sabem? Aquela ideia de que o homem é quem deve abastecer e cuidar da casa, da família. Esse é o papel do homem? No livro “A Coragem de Ser Imperfeito”, da escritora Brené Brown nos traz uma história interessante. Nela, um homem está afundado na vergonha por estar desempregado e diz: “é estranho! Meu pai sabe, mas a minha esposa não. Há seis meses, todas as manhãs, eu ainda me arrumo e saio de casa como se fosse para o trabalho. Só que eu me dirijo para o outro lado da cidade, me sento em um banco de praça e procuro emprego”. A vergonha de não estar desempenhando o papel de provedor também nos mata. Em 2016 um homem matou a esposa, os dois filhos e depois cometeu suicídio no Rio de Janeiro. A justificativa? A falta de recursos pro sustento da família. Na carta encontrada pela polícia ele escreveu, “Não vamos ter mais renda. Eu não vou conseguir sustentar a família”, e a pergunta que fica é: quem disse isso pra ele? Nós dissemos isso pra ele!
Não há dúvidas de que temos um modelo posto e idealizado do que é ser homem! Modelo esse que exclui as múltiplas formas de ser homem, gera efeitos colaterais que prejudicam os próprios homens, e ainda por cima, afeta uma sociedade inteira, principalmente na questão da violência de gênero contra mulheres, LGBTS e, claro, sem esquecer do recorte racial! É urgente repensarmos os modelos de homens e masculinidades possíveis!
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