O outono entrou dia 20 de março, junto com o ano novo astrológico. Outono é a estação em que as folhas caem, para que as árvores deixem ir a sua parte que mais consome energia e tenham resiliência para enfrentar o inverno, quando tem menos sol e portanto acontece menos fotossíntese. A quarentena no Brasil começou mais ou menos na mesma época e sinto que são tempos de deixar ir. Não sabemos ao certo o que nos aguarda, portanto precisaremos de resiliência para enfrentar o nosso inverno, aquele momento em que só fica o essencial. Sinto um forte chamado para olhar ainda mais pra dentro e deixar ir padrões de comportamento que não me servem mais.
Pra mim, vem forte a necessidade de soltar o controle, porque ele é apenas uma ilusão. Sempre foi, mas mesmo assim crescemos no Ocidente acreditando que podemos controlar a vida, as coisas e a natureza. Por tempo demais pautamos nossa forma de existir no paradigma da dominação e isso vale para a forma como construímos o capitalismo, a economia linear que olha para a natureza como recurso a ser explorado e sistema a ser dominado, e para as relações. Entre pessoas, e com o nosso ambiente, justamente aquele que nos mantém vivos aqui.
O coronavírus nos mostra que não é bem assim. Aliás ele joga luz nas sombras e na forma de viver de um sistema insustentável. Sinto que o chamado do corona é para cada um e todos se reinventarem, porque o mundo não será mais o mesmo quando a pandemia passar. Não pode ser. Viveremos um inverno pela frente. O outono nos prepara pra ele.
E depois do inverno vem sempre a primavera, aquele momento em que tudo volta a florescer.
Pela primeira vez em muito tempo, a humanidade tem a oportunidade de funcionar como uma teia e estamos percebendo na pele aquela máxima que todos somos um. Estamos todos ligados por um laço que se chama vida e numa quarentena para que ela possa existir. Onde minha atitude de ficar em casa se dá para salvar vidas. A sua também. Países inteiros numa grande pausa coletiva. Quando antes pensamos isso ser possível? Os cientistas nos fazem esse chamado de parar as máquinas e repensar o sistema há décadas, mas é um vírus invisível que nos obriga a sair do piloto automático. Um vírus que é transmitido por objetos, aqueles mesmos sobre os quais construímos as bases da nossa civilização. Focamos tanto no fora, no material que o invisível aos olhos se perdeu. Mas é justamente ele que nos pede pausa. Que nos pede uma nova consciência e uma nova forma de cada um se ver nessa grande teia da vida chamada Gaia.
Escolhemos entender isso pela dor, poderia ter sido pelo amor. Mas o mestre está aí e nesse momento nos resta respirar fundo diante da angústia de não saber como será o amanhã e agradecer a oportunidade de olhar pra dentro e sairmos da crise uma humanidade melhor. Um coletivo que volte a perceber que o maior valor é a vida e que a nossa função aqui nesse grande sistema é servir. Servir para regenerar aquilo que precisa ser regenerado: nossos valores, nosso sistema e nossas relações.
E para isso precisaremos ativar um outro centro de inteligência, talvez o mais importante nesse momento: nosso coração. E é escutando esse bater que saberemos aquilo que precisamos deixar ir para que possamos florescer nossa melhor versão, afinal esse inverno também vai passar.
Fe Cortez é fundadora do menos1 lixo, ativista e palestrante na Casé Fala.
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